Enquanto a vacinação contra covid-19 dá seus passos (aqui, ainda lentos) entre adultos e idosos no mundo, alguns grupos - particularmente crianças, grávidas e lactantes - seguem ainda mais distantes da imunização, por não haver certeza sobre a segurança da vacina em seu organismo.
Estudos e resultados preliminares, porém, dão motivos para otimismo - embora os dados precisem ser vistos com cautela por enquanto.
Vacinar o máximo de pessoas possível, com rapidez, é considerado indispensável para conter a disseminação do coronavírus e o surgimento de novas variantes ainda mais perigosas do que as atuais.
As crianças, em particular, compõem um quarto da população mundial, se levarmos em conta apenas o total de pessoas entre zero e 14 anos.
Portanto, cresce entre especialistas a preocupação de que menores de idade (sobretudo as crianças maiores e os adolescentes, que parecem transmitir o vírus de modo mais semelhante aos adultos) não sejam deixados de fora de programas de imunização, sob o risco de a eficácia deles ser comprometida.
Crianças e a experiência 'animadora' de Israel
Israel, o país do mundo com ritmo mais alto de vacinação contra a covid-19, já imunizou mais de 60% de sua população com ao menos uma dose. Mas estão fora desse grupo imunizado as pessoas com menos de 16 anos, a idade mínima recomendada para a vacina aplicada no país, a da Pfizer/BioNTech.
Isso despertou preocupações de que essa lacuna (junto à resistência de alguns grupos de adultos à vacinação) dificulte a obtenção de uma imunidade coletiva - embora seja importante lembrar que, de modo geral, as crianças são até agora o grupo populacional menos suscetível à covid-19.
Mas é também de Israel que vem uma das primeiras boas notícias relacionadas à vacinação infantil: cerca de 600 crianças e adolescentes de 12 a 16 anos foram vacinados no país por terem doenças pré-existentes que as tornam mais vulneráveis ao novo coronavírus. E, até o momento, elas não sofreram nenhum efeito colateral significativo da vacina, disse recentemente ao jornal britânico The Guardian o chefe da força-tarefa de vacinação israelense, Boaz Lev.
Não se trata de um estudo clínico, mas até o momento Lev qualificou os resultados como "animadores".
Estudos avançam em crianças e adolescentes
Para além de Israel, representantes da Pfizer afirmaram à agência Reuters que esperam confirmar nos próximos meses se sua vacina é segura para adolescentes. Para crianças mais novas, os resultados devem vir até o final do ano.
No Reino Unido, o Instituto Nacional de Pesquisas em Saúde iniciou em fevereiro estudos para avaliar o desempenho da vacina da Oxford/AstraZeneca em voluntários de 6 a 17 anos.
Quanto à CoronaVac, atualmente a vacina predominante no Brasil, ainda não há previsão de testes em crianças e adolescentes, informa o Instituto Butantan - acrescentando, porém, que a Sinovac (empresa chinesa parceira do instituto na fabricação do imunizante) está fazendo estudos de fase 1 e 2 com voluntários de 3 a 17 anos na China.
A vacinação no público infantil ganha ainda mais importância diante das novas (e mais contagiosas) variantes do novo coronavírus, explica à BBC News Brasil o pediatra e epidemiologista Fernando Barros, da Universidade Federal de Pelotas.
Apesar de ainda não haver dados conclusivos, a percepção de muitos cientistas é de que as novas variantes, ao afetarem um número maior de pessoas, acabam também afetando, proporcionalmente, mais crianças.
"Aumentando (o contágio) em crianças, será ainda mais importante ter a vacina para esse público", diz Barros à BBC News Brasil. "Nos países com grande cobertura vacinal, o grupo de 16 anos ou menos vai precisar ser imunizado para atingir-se uma (ampla) imunidade."
Aqui no Brasil, um estudo de caso para avaliar a imunidade coletiva está em curso em Serrana (SP), cidade escolhida pelo governo do Estado para imunizar toda a população adulta e verificar o comportamento do vírus depois disso. Os resultados, segundo o Instituto Butantan, sairão em maio. "Vamos ver ali o que vai acontecer com a infecção entre as crianças", aponta Barros.
Nos EUA, o médico Anthony Fauci, que comanda os esforços oficiais contra o coronavírus, tem dito à imprensa americana que, se os resultados dos testes clínicos já em curso forem positivos, crianças e adolescentes do país poderão começar a ser vacinados em setembro, no início do ano letivo no hemisfério Norte.
Os EUA são o país que, em números absolutos, mais aplicou vacinas até agora: cerca de 113 milhões de doses, ou quase dez vezes mais do que o Brasil.
Aqui, como não conseguimos sequer vacinar os grupos prioritários, não há dúvidas de que a vacinação infantil ainda vai demorar muito. Por sinal, se o ritmo atual de vacinação for mantido, o Brasil só conseguirá vacinar toda sua população em 2024, segundo as estimativas do portal Monitora Covid-19, da Fiocruz. A lentidão, junto à baixa adesão ao distanciamento social, desperta a enorme preocupação de que o país seja hoje o ambiente ideal para a proliferação de variantes mais perigosas do coronavírus.
O aparente poder indireto de outras vacinas
Enquanto isso, para reforçar a imunidade infantil, outras vacinas disponíveis no calendário de vacinação parecem aumentar, indiretamente, a proteção contra o novo coronavírus.
Um estudo recente dos EUA tem animado pediatras ao apontar que crianças vacinadas contra a gripe (influenza) tiveram menos chance de apresentar sintomas respiratórios de covid-19.
A campanha de vacinação contra a gripe no Brasil começará em 12 de abril, e entre os públicos prioritários estão crianças entre 6 meses e 6 anos de idade, gestantes e puérperas (mães que acabaram de dar à luz).
Estudos dão indícios de haver um efeito protetor à covid também das vacinas BCG (que protege contra a tuberculose e é aplicada pelo SUS em crianças de até quatro anos) e Tríplice Viral (que protege contra sarampo, rubéola e caxumba e é indicada a partir dos 12 meses de idade).
"Como essas vacinas estão recentes (no organismo infantil), elas são uma das hipóteses pelas quais as crianças têm uma proteção melhor contra o novo coronavírus, além do fato de elas terem contato com outros coronavírus menos nocivos", explica à BBC News Brasil o pediatra Daniel Becker, integrante do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ e do comitê de enfrentamento à covid-19 da Prefeitura do Rio.
Mães que amamentam podem tomar vacina contra covid-19?
Lactantes (mulheres amamentando) e grávidas também não foram incluídas nos primeiros testes clínicos das vacinas contra a covid-19, portanto ainda não se sabe o suficiente sobre a segurança da imunização entre elas. Mas estudos recentes trazem sinais preliminares alentadores - particularmente para lactantes.
O portal internacional e-lactancia.org, que reúne informações científicas sobre amamentação, revisou em janeiro o nível de risco da vacina contra covid-19 para "muito baixo" em mães que amamentam. O portal também destaca a recomendação atual da Organização Mundial da Saúde (OMS): "a vacina pode ser oferecida a uma lactante que seja parte do grupo recomendado de vacinação (por exemplo, profissionais da saúde), e não se recomenda a interrupção da amamentação depois da vacina".
Em março, veio de Israel mais um estudo de resultados positivos, feito com lactantes vacinadas: "o estudo mostrou produção de anticorpos no leite materno, sem maiores prejuízos para as mulheres, que também foram imunizadas", explica Daniel Becker.
Na prática, a vacina em si não passou ao leite materno, mas os anticorpos, sim, agrega o médico.
Mas é preciso fazer duas ressalvas importantes ao estudo israelense: primeiro, ele ainda não foi revisado por pares e portanto não pode, por enquanto, ser usado para orientar a prática clínica.
Em segundo lugar, ele foi feito com as vacinas da Pfizer e Moderna, que usam a tecnologia de RNA mensageiro - diferente das vacinas da CoronaVac (vírus inativado) e AstraZeneca (adenovírus), as aplicadas no Brasil até o momento. Portanto, não podemos transpor as mesmas conclusões para vacinas com tecnologias diferentes.
"Podemos imaginar que, de modo geral, não há riscos e pode até haver um efeito imunizante (para o bebê ao ingerir o leite materno), mas precisamos de mais estudos para ficarmos mais tranquilos", agrega Becker.
Mulheres grávidas e vacinas contra covid-19
Outro estudo, da Universidade de Harvard com o Hospital Geral de Massachusetts (EUA), testou vacinas da tecnologia mRNA em 131 mulheres, sendo 84 grávidas, 31 lactantes e 16 não-grávidas, como grupo de controle.
A conclusão, publicada em março, é de que "a resposta imune foi equivalente nas grávidas e lactantes, em relação às mulheres não grávidas". E anticorpos foram identificados tanto no cordão umbilical quanto no leite materno, sendo assim transferidos aos bebês.
"As vacinas mRNA contra covid-19 geraram uma resposta imune robusta nas grávidas e lactantes", escrevem os autores. Mas, novamente, trata-se de um estudo ainda não revisado por pares e que não abrangeu as vacinas por enquanto usadas no Brasil.
Por enquanto, ainda prevalece então a cautela, em especial para gestantes.
Ao mesmo tempo, os CDCs (centro de controles de doenças dos EUA) lembram que as mulheres grávidas têm risco maior do que as não grávidas de desenvolver as formas mais severas de covid-19.
A recomendação geral ainda é de que grávidas que sejam parte de grupos já aptos à vacina (como profissionais de saúde, por exemplo) avaliem seu caso com seus médicos e decidam se querem ou não tomar a vacina.
Mas, novamente, os sinais são positivos. Os CDCs lembram que, pelo modo como as vacinas agem no corpo, "especialistas creem ser improvável que elas tragam risco às grávidas". E estudos em animais feitos com as vacinas Pfizer/BioNTech, Moderna e Janssen (Johnson & Johnson) não identificaram perigos na vacinação de gestantes até agora, mas testes clínicos ainda estão em curso.
Por: Portal Forte News **Com informações do BBC
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